sábado, 19 de junho de 2010

Relação com os pais também é assunto de hospital!

Falamos muito de relação com os pais. Uma relação que deverá ser coesa de modo a constituirem-se como parceiros educativos no sentido de rumarem juntos num caminho de parceria educativa. No hospital, essa relação é constante. Neste sentido deixo-vos uma pequena reflexão que fiz no seguimento do que experienciei e observei no meu contexto de estágio, no Instituto Português de Oncologia.


A relação com os pais – a especificidade do contexto hospitalar
A relação com os pais, em qualquer contexto, deve ser um dos aspectos a considerar pela equipa pedagógica. O educador deverá desenvolver com a família um trabalho de parceria, ao invés de a ver como adversária. Pais e educadores deverão arranjar as melhores estratégias para que a criança sinta que ambos “rumam” com vista a atingir um objectivo comum: o bem-estar da criança, e o seu desenvolvimento pleno.
Em contexto hospitalar, a importância de fomentar uma relação de parceria, com os pais, não é excepção, muito pelo contrário. Tendo em conta que no internamento os pais estão com os seus filhos, 24 sob 24 horas, as relações estabelecidas são, por um lado mais difíceis mas, por outro, mais autênticas. Num contexto em que o convívio com a família é diário e constante, o educador não tem espaço para fingir algo que não é. Ou seja, em muitos locais é certo que há educadores que se dizem preocupados com a relação com a família mas limitam-se a fazê-lo através de reuniões e de uma forma não tão verdadeira. Por vezes o que acontece, é que o educador não conduz a sua prática de igual forma perante um pai que está presente. Assim sendo, no hospital o educador é aquilo que é, e as suas atitudes terão que ser genuínas. Procura-se então privilegiar a relação com a família, visando a promoção da segurança e o bem-estar da criança que está doente. Contudo, o trabalho com as famílias, no hospital, embora possa ser intenso pode ser igualmente, pontual, uma vez que, se restringe ao tempo que a criança está internada. No entanto, importa dar importância ao relacionamento, independentemente do tempo de internamento, permitindo uma maior convivência do dia-a-dia, facilitando uma maior à vontade para os pais desabafarem, trocarem e partilharem experiências quer com a equipa pedagógica quer com os restantes pais. Este espaço de diálogo e compreensão que se cria, contribui para um bom relacionamento com os filhos, quer seja numa situação problemática quer seja numa actividade lúdica. Desta forma, o educador deverá ter presente que a sua função não é, nem poderá ser, exclusivamente direccionada para as crianças, quando contactam permanentemente com os pais. Ter os pais como parceiros educativos e contemplá-los no trabalho em equipa, é muito importante e facilita o convívio. Um simples “bom dia”, o estimular, incentivar, ajudar por parte do educador de infância, no hospital, permite aos pais um maior sentimento de bem-estar, mesmo estando numa situação de profunda dor e culpabilização.
Para além destas situações, o educador de infância poderá conseguir o que mais ninguém parece contemplar: integrar os pais nas actividades propostas. É evidente que nos preocupamos em que os pais saiam do internamento, passeiem, conversem com outras mães.
Mas por outro lado, e esgotadas todas as outras hipóteses, parece-nos pertinente pedir a colaboração dos pais em pequenas actividades da rotina, pois segundo Biscaia (1989): “ É importante ocupar a mãe dando-lhe tarefas e responsabilidades de colaboração no tratamento, dentro das suas capacidades. O ter um trabalho a cumprir modera a angústia.” (p. 141)
Embora me pareça importante ressalvar o facto de ser fundamental impor limites, na medida em que, ao entrarmos numa relação de extrema confiança podemos estar a comprometer a nossa acção educativa, o educador deverá mostrar-se, por outro lado, disponível e receptivo aos pais. Saber ouvi-los, esclarecer dúvidas, aceitar as suas inseguranças. “Terá de haver assim uma verdadeira interacção, Hospital-Criança-Pais como circuitos que se entrelaçam e se interpenetram.” (Biscaia, 1989, p. 140)
Apesar de haver muitas fontes acerca do trabalho com as famílias, poucas são as que abordam a especificidade do hospital. O que lá se passa é muito diferente… daí a minha vontade de escrever acerca deste assunto. É certo que várias foram já as reflexões feitas com este tema, contudo, volto a afirmar, é bem diferente. Não é que a relação com a família, no hospital, tenha que existir com mais intensidade do que noutro contexto educativo, simplesmente é uma relação que, quer o educador acredite ou não, tem de ser fomentada. No entanto, no IPO as três educadoras acreditam, apoiam e estimulam a relação com os pais. É fundamental que não nos esqueçamos da importância que a presença, permanente, dos pais tem para as crianças. “ (…) É uma altura em que uma criança precisa de segurança e conforto, mais do que em qualquer outra.” (Brazelton, 1992, p.217)
Em conversa com algumas mães, fiquei a saber (mesmo já tendo a oportunidade de ir observando tal facto) que no IPO se sentem em casa. Quando têm de ir para outro hospital sentem muita falta dos médicos, enfermeiros, educadores do IPO. A relação humana, existe efectivamente! Os pais são integrados como membros da equipa (quer da equipa médica, quer da pedagógica). Vemo-los como parceiros! “Pais e profissionais continuam excessivamente dependentes de modelos rígidos e tradicionais de divisão de papéis e responsabilidades, o conhecimento científico e objectivo é excessivamente valorizado em detrimento das significações subjectivas e da multiplicidade das experiências individuais e familiares.” (Barros, 2003, p. 192)
Em suma, há que reflectir acerca desta temática com o objectivo de garantir “mais e melhor” a cada criança e a cada família que recebemos… diariamente!
“É numa sociedade mais globalizada, de maior descentralização e participação política e administrativa e em que os valores e os objectivos se alteraram radicalmente que a relação escola-família tem vindo a conquistar uma crescente importância no plano da política educativa, da investigação educacional e das práticas escolares.” (Magalhães, 2007, p.21)
Assim sendo, seja que família for (tendo em conta que temos crianças portuguesas mas também oriundas dos PALOP, entre outros) deverá o educador de infância manter-se imparcial e mostrar-se receptivo logo à chegada, tal como acontece noutro contexto educativo. Ao recebermos uma criança recebemos, igualmente a sua família. E neste contexto específico, é literalmente assim: os pais também ficam “internados”. Desde que a criança nasce, a sua família é o primeiro agente de socialização, representando o primeiro modelo de interacção. Assim, é natural que a criança nas suas atitudes, acções e brincadeiras reflicta o ambiente familiar, ou seja, as suas experiências culturais. É a família que lhe transmite os primeiros afectos, comportamentos e valores e onde a criança realiza as primeiras aprendizagens.
Independentemente das percepções sobre o que constitui uma família, existe um reconhecimento consensual do impacto que este contexto tem no desenvolvimento das crianças.
Para que a criança doente continue a ter uma estabilidade emocional, tão necessária neste momento, e possa continuar a adquirir conhecimentos e saberes, é fundamental que haja uma boa articulação entre o educador de infância e a família. “O contacto entre a família e o educador é uma questão primordial, que convém cuidar e fazer funcionar” (BASSEADAS, 1999, p. 283).
Portanto, é essencial que exista, de ambas as partes, e tendo em conta um contexto tão carregado de dor e sofrimento, transparência, confiança, partilha e cooperação para se construir um elo de ligação entre elas. Todos estes aspectos beneficiam a criança, pois tal como refere Portugal (1998): “Trabalhar com os pais parece ser a melhor estratégia para a promoção do bem-estar e desenvolvimento da criança, dada a relação de maior intimidade e envolvimento com as crianças, conhecimento da individualidade e história da criança por parte dos pais” (p.127).
Assim, defendo que se torna relevante que, a partir dos conhecimentos que a equipa pedagógica tenha de cada família, se respeite as diferenças culturais, assim como, as características socio-económicas (no hospital encontramos muitas diferenças a estes níveis). Só uma relação de complementaridade entre família, e o educador de infância permitirá a adopção de atitudes e perspectivas de coerência, a nível de valores e critérios dos diferentes agentes educativos com influência no desenvolvimento da criança.
Desta forma, é também essencial que o educador, o hospital e a família possuam sentimento de plasticidade face às suas opções educativas, promovendo a descontinuidade ou a continuidade mediante o superior interesse e as necessidades e limitações da criança.



Espero que reflictam acerca desta temática para que nos consciencializemos de que não trabalhamos numa simples "conchinha"

2 comentários:

  1. Andreia

    Trazer esta temática é muito importante. O IAC faz um trabalho importante na área da humanização dos hospitais e também a associação "Nariz Vermelho". Para mim, o Hospital de Santa Maria tem educadoras a fazer um trabalho muito bom e sei que o Garcia da Horta começou um projecto de horta pedagógica.

    Professora Luísa Ramos de Carvalho

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  2. Esperemos que seja este o século no qual veremos mais práticas de qualidade em contexto hopitalar. Também o IPO faz o excelente trabalho!

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